A maioria das pessoas já entravam em suas casas, e o comércio ia se fechando.
Ouviam-se murmúrios vindo da hospedaria: o grupo de sempre de trabalhadores exaustos ia receber um pouco de conforto, juntamente a exploradores e aventureiros de toda parte. Os Campeões e Capelães terminavam de empacotar seu equipamento pessoal, enquanto os integrantes da Presa chegavam, alguns como corvos, cães, e até mesmo a neblina trazia alguns deles. Exceto os Caçadores. Esses faziam questão de caminharem e já fazer a primeira ronda da noite. A troca de turnos era sempre assim: Campeões e Assassinos trocando olhares ferozes, apesar de se respeitarem muito e serem parceiros de trabalho, e Capelães agradecendo pelo dia aos últimos raios de sol, e pedindo proteção aos colegas Caçadores que trabalhariam até a aurora para garantir o sono merecido dos moradores da cidade. Alguns desse últimos admiravam e agradeciam tanto uns aos outros que até sorriam e abraçavam seus irmãos de nação.
A grande capital fozzana não fugia à regra: enquanto o povo da Estrela se retirava, a Presa assumia suas posições.
Mas aquele fim de tarde não parecia comum, apesar da troca quotidiana de turnos. Tinha um ar pesado, denso, com a impressão de que algo muito importante estaria para acontecer. E realmente aconteceu. Ao invés da líder da Presa esperar o líder da Estrela sair do palácio, e toda a mudança de turno ocorrer ali também, naquele dia, parecia mais uma reunião entre os membros principais dos dois grandes clãs. Importantes coronéis e chefes de famílias estavam se cumprimentando e reunindo-se no átrio do palácio, gerando os mesmos olhares que os Assassinos e os Campeões atacavam-se, e os mesmos afetos trocados pelos Capelães e Caçadores. Todos iam acomodando-se aos seus respectivos lugares, e fazendo cada vez menos barulho. Quando o silêncio reinou, de arcos opostos do auditório, saíram Signora Rossi, a vampira-mor, grande chefe da Presa, e do outro lado, surgiu General Patthom, envolto em sua aura confortavel de segurança e confiança, fazendo com que todos os coronéis ficassem de pé até que seu líder sentasse.
Os dois encontraram-se no meio do auditório. Trocaram olhares. Ela fez o sutil plié, com uma leve inclinação da cabeça. Ele curvou-se, abaixando um pouco a cabeça, e endireitou-se abrindo os braços e indo na direção dela. Abraçaram-se. Separaram-se. Cada um foi para sua poltrona, e deu-se início a reunião que decidiria o que fariam com o avanço do Império sobre as terras do norte.
...
Após longas horas de discussões e argumentações variadas, o General sugeriu:
- Façamos como a Presa decidir melhor, eles tomam conta de nós contra o Imortal durante a noite. Não será diferente contra o Império. Eles estão acostumados a passar dias sem durmir andando sobre sob neve densa, sem descansar. A Presa decidirá como conteremos essa afronta ao nosso poderio.
Um longo momento de silêncio se fez até que Rossi levantasse para se pronunciar:
- Faremos como fazemos contra o Imortal: Cidades patrulhadas dia e noite. Estradas com barracas de ataque rápido com portais para as cidades grandes. E como sempre, fortaleza de energia sobre nosso território para nos avisar se qualquer disturbio ocorrer.
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Fizeram todos o voto de ciencia da estratégia.
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Os coronéis, já cansados iam se retirando aos poucos, assim como os chefes que iam se proteger da aurora eminente.
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O auditório encontrava-se quase vazio, porém, os líderes esperavam todos saírem, enquanto se encaravam.
...
Só sobraram os dois. Levantaram-se, caminharam um em direção ao outro. O primeiro raio de sol dividiu o salão so meio. Patthom e Rossi frente a frente. Divididos por um raio de sol.
- Como está Edward? - perguntou ele, com ar paternal.
- Bem. Recuperando-se da transformação ainda. - respondeu ela fria, mas logo relaxando um pouco, olhou acanhada para ele, e perguntou - E Erika? Tem progredido no batalhão? Já tem sua própria cor? Já fez alguma missão sozinha?
Ele gargalhou. Ela também.
- Após tanto tempo com tanto poder em nossas mãos, mas sem poder nos tocar mais, conseguimos a proeza de passar horas sem demonstrar o menor afeto, e mesmo assim, perguntar sobre nossos filhos como duas crianças perguntam uma sobre a viagem da outra. - disse ele com um sorriso no rosto, mas com uma cara de preocupado. Ela sorriu, mas logo fechou o rosto.
- Tenho que ir. O sol já raiou. Essa noite foi ótima. Obrigada por tudo.
Virou-se. Deu uns dois ou três passos e explodiu em névoa, espalhando-se pelo auditório, e desaparecendo pelas janelas. Ele deu um suspiro profundo. Deixou cair uma lágrima no chão. Virou-se e saiu.
O futuro foi jogado. O Exército e a Presa novamente uniram-se para defender a nação contra uma força grande. Já não bastava os ataques constantes do Imortal, agora teriam que conter o Império. Novamente teriam que pedir ajuda aos dragões, que sempre foram muito racionais, formais e impessoais com todo humano.
Eram tempos difíceis. Mas diferente do pôr-do-sol pesado do dia anterior, o dia que acabou de começar tinha um ar leve e esperançoso, como se a noite tivesse levado embora um problema muito grande.
A névoa foi se afastando das cidades. O murmúrio do comércio e dos trabalhadores, assim como o da hospedaria começava novamente. A troca da guarda ocorria novamente. Os Assassinos escoavam pelas sombras rapidamente, enquanto os Caçadores terminavam a última ronda, e encontravam seus amigos Capelães e contavam o turno para eles. O Campões acordavam mais lentamente, sendo bem lerdos no raiar do sol, mas ainda sim, muito mais atentos que os cidadãos comuns. O sol brilhava forte no céu, e toda rotina começara novamente. Com um ar mais leve. Mas recomeçara como todo dia, e os aventureiros iriam continuar suas jornadas e explorações sobre terras e culturas diferentes daquelas que já conheciam.
Os mais atentos leram os avisos que foram deixados em suas hospedarias: "A partir de hoje, os mortos-vivos não são mais nosso único problema. Todo aquele com cabelos ruivos e olhos claros que falar uma lingua semelhante ao germanês, deve ser abatido assim como aqueles que atacam pelo Imortal. O Império é uma ameaça. Ataquem como atacam o Imortal."
Eram tempos difíceis. Mas para a maioria tudo voltara a acontecer como no dia anterior.
Grato,
Lord Iron Druka